Deus é brasileiro

Um malandro no Rio, um ex-ministro no Recife, um catador de papel em Curitiba, um guia num museu de Salvador, um pregador evangélico em São Paulo – são apenas algumas das figuras que povoam esta obra. Um livro sobre as franjas da sociedade, miscigenação e personagens de romances, sobre pintura e arquitetura, sobre invasores holandeses e imigrantes judeus, sobre sonhadores e aventureiros, sobre o orgulhoso lema da Bandeira brasileira “ordem e progresso”. Ou a sua falta. Harrie Lemmens viajou, com a esposa, a fotógrafa Ana Carvalho, por oito cidades. O resultado são inúmeras imagens e histórias que, no seu todo, compõem um relato muito rico sobre o nosso país. Partindo de conversas com escritores, amigos e passantes e graças às fotografias de Ana Carvalho, Deus é brasileiro mostra os muitos rostos do Brasil. Um livro que se deve ler e é um prazer para qualquer leitor.

Tradução: Mariângela Guimarães

 

Umas reações brasileiras a Deus é brasileiro de Harrie Lemmens, com fotografias de Ana Carvalho, publicado pela editora Zouk, Porto Alegre.

Edney Silvestre, facebook:  Excelente retrato do Brasil contemporâneo

Alice Ruiz, facebook: Grande livro, retrato brilhante do Brasil, delicioso de ler.

Estrela Leminski: “Deus é brasileiro” é essencial!!!

Alice Ruiz, facebook: “Deus é Brasileiro” de Harrie Lemmens, é um retrato do Brasil, sem críticas, mas que põe os dedos em nossas feridas, amorosamente. Já disse e continuarei a dizer: fundamental.

Zuca Sardan: Este livro é uma bomba!

Luciana Villas-Boas:

Caro Harrie,

Ah, nosso desencontro: novamente, não estarei no Brasil nos dias de sua turnê de lançamento. É, realmente, uma pena para mim.

Li um bocado de DEUS É BRASILEIRO esta tarde mesmo, os capítulos sobre Salvador/Itaparica/João Ubaldo; depois, um pouco de Ilhéus; a São Paulo do Lourenço Mutarelli e do Mario Sabino. Em seguida, fui para Porto Alegre, as conversas com Scliar e Veríssimo, e para o Rio de Janeiro de Edney e Carola Saavedra. Pulei Curitiba e Tezza, mas vou voltar. Que grande ideia costurar textos de viagens pelo Brasil com visões literárias a partir de escritores que você traduziu. Ficou lindo.

Fascinante, o seu livro. Delícia de escrita, a sua, e delícia de leitura. Algumas frases tão fortes e visuais, como aquela sobre o crack, na parte do Mutarelli, “uma faca cega que raspa o cérebro até o osso”. Espero que encontre muitos e muitos leitores na Holanda e no Brasil. Me conte sobre isso.

Parabéns, muito obrigada pelo convite para os lançamentos. Farei um post para fb da VBM. Parabéns à Ana também pelas fotos que ilustram o livro magnificamente.

Abraço,

Luciana

 

J. Solha, excritor

JÁ ESTEVE ALGUMA VEZ NO BRASIL?

Acabo de ler em pdf, por especial deferência de Harrie Lemmens ( que me conhece de O Som ao Redor, que viu em Amsterdam ), o livro sobre as viagens que fez por aqui, como tradutor de grandes autores brasileiros para o holandês.  Deus é Brasileiro – God is een Braziliaan ( editora Zouk ), é um analítico, crítico,  ágil, denso, fascinante relato, lido por mim como se fosse um muito vivo e revelador   romance, registro importantíssimo que será lançado no país em plena Feira do Livro de Porto Alegre, no próximo dia 14, depois em Curitiba ( 17 ), Rio (19 ) e São Paulo ( 21). A obra condensa três passagens de Lemmens pelo Brasil,  que lhe permitiram conhecer ainda mais a fundo uma nação pela qual vem há anos constantemente passando, através dos nossos caríssimos João Ubaldo, Machado de Assis, Autran Dourado, Sabino, Daniel Galera, etc, etc. Senti, pelo desenrolar desse texto, o mesmo fascínio que sempre me causou o retrato do Brasil deixado pela equipe de Nassau, a começar de Barleus e seu imenso esforço histórico sobre o período maurício no Recife, acrescentando-se Frans Post e a eternização de nossas paisagens, levadas para a Europa;  Eckhout a fazer o mesmo com os nossos tipos humanos (todos os tipos), servindo-se Lemmens, também, do olho clínico de um Willen Piso, somado ao de um Markgraf. Sua compreensão do que somos ( profundamente alicerçada no conhecimento do que fomos ) se torna muito maior que a nossa, porque é a de quem chega e vê, de imediato, o macro e o micro de tudo.

ÁGIL

Eu disse que seu livro é ágil. E Deus é Brasileiro realmente o é. Visitando Salvador, Olinda, Recife, Rio, Belo Horizonte, Curitiba e Porto Alegre, cidades de imenso ( agora decadente ) passado católico, nosso visitante chega a um ponto, em Minas, em que – depois de tanta descrição de tudo que vê  – diz “basta, chega de igreja”, quando passa a falar do Grupo Corpo, de dança, que considera extraordinário. Age como o editor de um filme já na iminência de saturar o espectador, e que por isso corta, corta, suprime, atalha, atento ao ritmo da obra ( antes de tudo )  de arte.

DENSO

Eu disse, também, que esse livro é  denso. Como consegue fazê-lo, também, ágil? Com o bisturi do uso preciso da vivência e informação. Para tanto, lá vem um natal passado com Luís Fernando Veríssimo, em Porto Alegre; a visita a um sofrido Raimundo Carrero, no Recife, quando dá com o romancista recentemente vitimado por um AVC; seus encontros com um revoltado Fernando Monteiro, também no Pernambuco; um estranhíssimo Lourenço Mutarelli ( de Cheiro do Ralo ) e um polivalente Marçal Aquino, em São Paulo; um inquieto José Castelo – em Curitiba e no Rio. Mas talvez o melhor do Deus é Brasileiro seja seu enorme elenco de figurantes, criaturas da elite e do povão vistas como que por um Brueghel, Otto Dix, Daumier, Henfil:

– Na Livraria Saraiva, Higienópolis, São Paulo,  (…) vejo uma senhora enrugada, toda vestida de preto, que parece saída de um romance de Machado de Assis ou Lúcio Cardoso, grande romancista mineiro. Frágil como um velho pergaminho. Dá a impressão que vai esfarelar e virar pó se alguém a tocar. Coberta de joias. Este é o seu mundo. Bonita é a chegada de uma outra senhora. Cumprimentando como um flashback em câmera lenta. Vê-se a autoconfiança do dinheiro, que ali também pode ser exibido — na rua é muito perigoso.

E ele fala dos showrooms de Mercedes, BMW, Porsches: casas que ostentam Lamborghinis, Ferraris, Bentleys, Rolls Royces.

– Para onde se vai com esses carros,  num país onde assaltos e sequestros são coisas rotineiras?

É ácido o detalhe com que encerra a descrição do Museu Afro Brasil, ainda na capital paulista. Sob o retrato de André Rebouças, que lutara pelos direitos iguais para os negros, contribuindo para a abolição em 1888, cruzam – diz ele – quatro visitantes brancos e uma faxineira negra.

O mesmo ele vê em Minas, entre os funcionários ( um verdadeiro exército uniformizado com calça jeans e camiseta vermelha ) do célebre Centro de Arte Contemporânea de Inhotim:

– A maioria é negra. Os postos mais altos — recepcionistas, guias, motoristas dos carrinhos de golfe e pessoal da administração — são mais claros ou brancos.

Veja este lance, no Rio:

– O edifício do banco é um leque de tons de azul — índigo, opala, cobalto — em linhas retas de concreto e vidro. A dois metros e meio de altura, na fachada da casa de esquina com uma rua estreita, um emaranhado de cabos sai de um disjuntor azul escuro sobre a placa de rua da mesma cor: Rua do Ouvidor — na época de Machado de Assis, a principal via de comércio do Rio. Onde outrora a fina flor das donzelas, como Flora, de Esaú e Jacó, olhava as vitrines e fazia encomendas em magazines luxuosos, agora plena de lojas de um escalão mais baixo. Placas de liquidação em verde e amarelo, prateleiras e balcões cheios de mercadorias rebaixadas. “Aqui chipi de memória”, grita um vendedor com pen-drives, golpeado pelos mata-moscas de seu colega: “Aqui mata-mosquito!” Saias curtas e blusas finas, chinelos sob jeans esburacados. Samba, brega, rock. Uma cacofonia. Pipoca e frango assado, cheiro de hambúrguer e chiado de refrigerante. Calçadas arrebentadas. Pedras soltas e buracos, areia enlameada.

TUDO

Ele registra tudo. Conversa com intelectuais, deslumbra-se com as realizações de Niemeyer, com a Baía de Guanabara, conversa com taxistas, catadores de papel, garçons, banhistas de Copacabana, num somatório que registra o momento muito ruim da autoestima e da economia brasileira, muita gente a favor, muita gente esculhambando com Lula e Dilma. Choca-se quando vê o aviso, no mapa com as estradas bahianas:

–  “Aqui há bandidos.”

HISTÓRIA

O conhecimento de nossa História lhe explica muita coisa:

– Alvará, de 6 de maio de 1536: “Ordenou o dito senhor que os moços vadios de Lisboa que andam na ribeira a furtar bolsas e fazer outros delitos, a primeira vez que fossem presos, se depois de soltos tornassem outra vez a ser presos pelos semelhantes casos, que qualquer degredo que lhes houvesse de ser dado fosse para o Brasil.”

E quanta malandragem, desde o nosso começo! Quando Lemmens observou o fato curioso de que na igreja Senhora do Rosário dos Homens Pretos, construída por escravos no século XVII, só havia uma torre, como já notara em várias outras, da época, foi-lhe esclarecido:

Um truque para enganar o fisco: o Tesouro português cobrava impostos de edifícios completos no Brasil, inclusive igrejas, e por isso eram projetadas duas torres, mas nunca construídas. Construção incompleta não pagava imposto.

FLUÊNCIA

Foi uma delícia ver a fluência com que o nosso viajante analisa – de leve – a obra de Jorge Amado, com sua “inversão de bem e mal”:

– Aqueles que não são considerados bons na sociedade — putas, pequenos gatunos e mendigos —, ou que são qualificados como inferiores — negros, mestiços e campesinos —, tornam-se heróis em seus livros, e tudo o que tem autoridade e é considerado superior é perverso, violento e ganancioso. Esquemático, mas funcionou porque era surpreendente.

SURPREENDE

E ele muitas e muitas vezes me surpreende. Como quando, feito Freud ao nos mostrar um abutre na Virgem do quadro “Maria, Sant´Anna e o Menino”, de Da Vinci, vê uma forma a que eu não tinha até então atinado,  no “Tiradentes” do Pedro Américo, que “ aparece em pedaços no cadafalso”:

– junto com duas pernas decepadas e um braço pendurado, o tronco traça o contorno do mapa do Brasil.

Sobre Leminski:

– Só depois de sua morte ganhou reconhecimento. Mas foi o reconhecimento de uma cidade que precisa de grandes nomes, e na falta de alguém mais adequado, adotou a quem na verdade detestava. E agora é Leminski pra lá e pra cá em Curitiba.

Todos sabemos que Portugal teve um período de enorme fausto – em grande parte transferido para a poderosa Londres – graças ao ouro de Minas. Lemmens vai mais além:

Quem não tem medo de fazer associações ousadas, poderia dizer que o Brasil financiou a revolução industrial da Inglaterra.

BALANÇO GERAL

Balanço Geral dessa minha leitura: o título Deus é Brasileiro  é uma sátira à nossa velha assertiva bairrista. A menos que o deus a que se refere seja o mesmo – tribal – dos judeus, que, infelizmente, está lá, no Velho Testamento: egocêntrico, irresponsável e violento. Lemmens nos enche de afagos, mas seu veredicto sobre nossa condição é duro. Situação da qual podemos sair, mas não será fácil num país onde desleixo, laisser faire, desdém, violência e interesse próprio, ou seja, pegue o que puder pegar, parecem ser de alto a baixo os cinco mandamentos seculares.

 

Raimundo Carrero:

http://www.diariodepernambuco.com.br/app/noticia/politica/2016/01/04/interna_politica,619335/opiniao-raimundo-carrero-diz-que-o-brasil-tem-um-grande-destino-que.shtml

Opinião: Raimundo Carrero diz que o Brasil tem “um grande destino, que passa pela cadeia””Somos, sim, um país de grande destino. Mas que destino é este que precisa primeiro passar pela cadeia?”

Por: Diario de Pernambuco

Publicado em: 04/01/2016 07:00 Atualizado em:

Por Raimundo Carrero

Escritor

Tudo bem, somos um grande povo, uma grande nação,uma gente maravilhosa,  mas, afinal, como explicar nossa busca de destino notável em meio a tormentas, corrupção, bandidagem, canalhismo, vagabundagem, drogas, negociatas, destempero? É possível dizer que assim é a condição humana, sendo o coração o campo de batalha. Sim, pode-se dizer tudo isso, estou seguro. É assim em todo o mundo, em toda nação, embora aqui as coisas acontecem de forma diferente. Muito diferente. Somos caóticos à nossa maneira.

Perguntamos incessantemente: Que país este? Uma indagação que repercute em nós faz tanto tempo. Dizem que esta frase vem de Francelino Pereira  desde os tempos de Arena e de MDB. Assim ganhou os foros de autoria da frase. Em seguida, Affonso Romano de Santanna escreveu um belo livro de poemas com a mesma pergunta. No tempo em que poetas uniam forma e conteúdo, com profunda preocupação política.

No entanto, a pergunta já está em Prometeu Acorrentado e parece que perdemos o gosto pelo estudo. Basta ir um pouco adiante para verificar que as frases rebuscadas e arrumadas vêm dos gregos, em que Freud e Dostoiévski foram buscar toda inspiração. Mesmo assim, ainda hoje dizemos que a frase original é de Francelino Pereira.

Mas se Francelino imitou o grego, ou foi buscar palavras no Prometeu, o holandês Harri Lemmens deu foros de verdade ao papa Francisco e a uma certa tradição tupiniquim escrevendo o livro Deus é Brasileiro, agora publicado no Brasil pela Zouk editora, de Porto Alegre, com tradução de Mariângela Guimarães. Ele percorreu o país de ponta a ponta, destacando cinco capitais, entre elas Recife, entrevistando intelectuais, jornalistas, motoristas de táxis, populares, para entender, afinal, que país é este?

O resultado é este livro notável, embora nos desgoste, e desgoste muito. Somos, sim, um país de grande destino. Mas que destino é este que precisa primeiro passar pela cadeia? Zuca Sardan escreve no prefácio que “Harrie conta mesmo as verdades. O que é melhor para nos, porque ele gosta do Brasil, mas não fica contando lorotinha, pra nos fazer gosto.” O que me agrada, e agrada muito, é que o Brasil é um desafio, um desafio que nós gostamos de enfrentar e amar.

 

Júlia Abreu de Souza:

Sou do Rio de Janeiro, uma das cidades visitadas por Harrie Lemmens, em seu livro “Deus é brasileiro”, recém-editado pela Atheneum-Pollack & van Gennep.

Leio seu livro com voracidade, viajando no mesmo compasso e com o mesmo entusiasmo do autor em sua passagem por oito cidades brasileiras.

O relato vai de descrições de lugares, paisagens, arquitetura, encontros com jornalistas, escritores, artistas, políticos, guias, curadores de museu, donas de casa, vendedores de rua, motoristas de táxi, catadores de papéis à citações e informações de cunho histórico. Não se trata de um livro para quem busca informação básica e rápida sobre o Brasil, tampouco é um livro de turismo, mas para aqueles que desejam conhecê-lo melhor, através dos olhos e espírito de observação do renomado tradutor da língua portuguesa. Com frases curtas, o seu estilo acompanha o dinamismo das capitais que visita, com variações de tema, cenário e vivências. A narrativa passa de fatos históricos, para o dia-dia tumultuado de uma metrópole como São Paulo, aos calçadões folclóricos do Rio, dando ritmo e vitalidade aos fatos. Por vezes, há um excesso de informação e detalhes sobre igrejas, prédios, personagens, instituições. A meticulosidade do autor, em seu afã em tudo retratar, pode atordoar o leitor.

O crescimento da economia brasileira nos últimos dez anos incorporou cerca de 35 milhões de brasileiros para o mercado consumidor, provocando muitas mudanças, em todos os sentidos. Harrie Lemmens vai mais além de apontar as questões que a imprensa fora do Brasil há anos repete, para consternação geral dos brasileiros em ver o país tão complexo ser constantemente enquadrado em meros estereótipos. Porque o Brasil não se deixa explicar facilmente.

Harrie não tem ilusões: “Não, a História (dos países) não é bonita. Nunca. Em lugar nenhum. A história é um relato de violência.”

Ele percebe contrastes, a beleza e a decadência, a pobreza e a riqueza, a amabilidade, e a violência, o jogo de cintura e a intolerância, dentro de um todo, da imensidão, da enorme diversidade, e do contexto histórico em que tudo isso foi produzido e realizado.

O olhar estrangeiro – arguto e amoroso (porém, a paixão de Harrie pelo Brasil não lhe cega) traz reconhecimento, e, ao mesmo tempo, estranhamento: É estranho, alguém de fora falar tão extensivamente e profusamente de coisas agregadas, incorporadas e fixadas na retina de alguém nascido, criado e educado no berço do “Brasil brasileiro”. O olhar estrangeiro de Harrie é uma leitura de confronto e reencontro.

 

ENTREVISTA

Júlia Abreu de Souza e Margô Dalla: entrevista com Harrie Lemmens: http://rascunho.com.br/traduzir-e-inventar-o-que-ja-esta-la/

 

FUNDAÇÃO JOSÉ SARAMAGO

Andrea Zamorano sobre “Deus é brasileiro na Fundação José Saramago, em junho de 2016: “Deus é brasileiro” de Harrie Lemmens é o livro dum homem muito culto que conhece a história e a literatura do Brasil e de Portugal, mas que escreve sobre tudo isto duma maneira pouco académica. É como se nós andássemos a passear com um amigo por uma cidade que a gente desconhece, e ele vai nos contando histórias e explicando coisas do lugar a partir da arquitetura, da literatura e de palavras de escritores a quem ele vai dando voz. Não consigo encaixar o livro, porque não é um guia, não é um romance, mas também não é preciso encaixá-lo em lugar nenhum, porque o livro é apenas bom, e sendo apenas bom, não precisa de mais nada, ou seja, leiam porque é bom. Apesar de ter muita história, muita arquitetura, e ser muito bonito do ponto de vista da escrita, o livro não deixa de ser crítico. E isso é um ponto de vista muito interessante para quem fala dum outro país. Publicar um livro no Brasil em que se critica o Brasil exige muita coragem!
As fotos de Ana Carvalho fazem a conexão com as histórias que o Harrie vai ouvindo o tempo todo. As histórias dos catadores de papel, dos taxistas, dos pregadores na rua, dos escritores (vivos e mortos). As cidades são feitas não só de prédios, são feitas de pessoas. O mágico do livro é talvez isso: tem esse componente de trazer a questão do quotidiano, da vida das pessoas, da existência normal, de qualquer pessoa, mas simultaneamente o Brasil não perde a sua extravagância, nem perde o seu fascínio por nós estarmos a falar das pessoas e das suas vidas reais. No livro as coisas coexistem, mas sem uma visão deslumbrada do Brasil, uma visão cliché do Brasil, uma visão estereotipada. “Deus é brasileiro”. Editora Zouk, Porto Alegre 2015.